Mais um jogo imortal... Perdão, uma sucessão de jogos inesquecíveis (fase de apuramento) que apuraram o Sport Lisboa e Benfica para uma final europeia que foi um jogo memorável... Imortal.
O Benfica já tinha vindo a ameaçar desde 1950, altura em que
venceu a segunda edição da Taça Latina. No quadro, vemos o Benfica em quarto lugar atrás do Milan, Barcelona e Real. Já era o clube Português mais famoso na Europa.
Também já contava com um grupo de jogadores excepcionais e ainda faltavam Simões (ainda junior) e... Eusébio. Em 1959, o Benfica contrata mais uma peça fundamental: O treinador Bela Guttman... Foi buscá-lo ao porto...
Estavam lançados os dados para uma época de maturação (1959 1960) que iria ser a rampa de lançamento para uma década excepcional, isto após a época dos violinos (Eles que até tinham muito mais para dar, deixaram-se ultrapassar por um Benfica portentoso que escolheu trabalhar os alicerces para partir para a conquista da Europa)...
Conta-se que Guttman, no início da época 60-61, tinha a firme convicção de que aquele seu Benfica poderia ir longe na edição da Taça dos campeões! É que o treinador propôs à direcção do clube a inclusão de uma compensação especial para o caso de a equipa vencer a prova...
Eu ainda não era nascido, pelo que a história deverá ser contada por palavras de outros. Comecemos pelos jogos que conduziram à final:
Uma fotografia publicitária referente ao jogo na escócia:
Algumas imagens do jogo.
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A equipa da primeira mão: Costa Pereira, Neto, Mário João, Santana, Coluna, Cruz, Cavém, Germano, Saraiva, José Augusto e José Águas (cap.) |
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O golo de José Augusto e Costa Pereira à imperador. |
De seguida o Ujpest:
Algumas fotografias dos jogos frente ao Ujpest:
Há aqui também uma história interessante sobre Guttman. Ele era húngaro naturalizado austríaco. Por precaução, não fosse acontecer algum imprevisto, ficou em Viena onde recebeu constantemente através do telefone, notícias sobre o que se ia passando no jogo!
Continuando na marcha para a final...
Algumas fotografias dos jogos frente ao Aarhus:
As meis-finais:
Os bilhetes de ambas as partidas:
Este é o golo de Cavém (enorme jogador) no estádio da Luz:
O capitão José Águas:
Uma nota interessante referente ao jogo da segunda mão. O árbitro terminou o jogo cerca de dois minutos antes do tempo regulamentar! Pelo que se conta, o árbitro não assinalou grande penalidade num lance dentro da área do Benfica. Não sei se foi ou não mas o que aconteceu foi que o pessoal adepto do Rapid não gostou e perdeu a cabeça! Conta-se que a comitiva do Benfica esteve largos minutos fechada nos balneários enquanto a policia austríaca não foi capaz de conter os violentos protestos (Onde já ouvi dizer que isto aconteceu?).
Eis que o Benfica chegava pela segunda vez à final da prova mais importante de clubes da Europa (Pouco me importa que alguns desvalorizem a Taça latina).
A grande equipa da altura era o Real Madrid mas o Barcelona tinha-se agigantado pelo que à partida reunia o favoritismo para vencer a final.
Conta-se que cerca de dois mil portugueses acompanharam a equipa até à Suíça, que a federação vendeu cerca de 236 bilhetes e que o Benfica vendeu 342 (embrulhem).
Facto: O Benfica preparou a final com muita ponderação. Guttman e os
seus pupilos partiram para Berna sete dias antes da final, enquanto o
Barcelona chegou dois dias antes... Mas o Benfica não foi passear mas sim para
Spiez, lá nas montanhas para se concentrarem.
O Barcelona estava em vantagem não só no favoritismo mas também no número de adeptos, mas diz-se que um dos factores decisivos, aconteceu nos momentos que antecederam o início da partida: Quando a banda de música tocou
A Portuguesa, os adeptos e jogadores do Benfica cantaram-na em uníssono de forma tão potente e resoluta que se diz que foi uma espécie de primeiro abanão no tal favoritismo espanhol.
Ficam as fotos da partida memorável:
Grande jogo que terá sido pelo que pude ler e ver, mas há uma história que quero ser eu a escrever aqui, a história de
Mário Coluna. Dedico-a ao actual presidente do Sport Lisboa e Benfica: Com o resultado em 2-1, Coluna levou uma pancada, perdeu a consciência e foi levado para fora de campo. O Benfica jogou com dez jogadores e manteve o resultado nos tais 2-1.
Conta-se que Coluna, assim que recuperou a orientação, e já nos balneários, foi informado do que lhe tinha acontecido e a primeira coisa que fez foi perguntar qual era o resultado do jogo naquele momento... Coluna ergueu-se, voltou para o campo e marcou aquele terceiro golo absolutamente espectacular.
Não se admirem os jovens do porquê de tanta consternação pela partida deste jogador absolutamente excepcional em Fevereiro deste ano...
Esta foi a ficha da partida (total de 26-10 em golos...):
Terminava a partida, se tivemos sorte? Sim, houve quase uma mão cheia de bolas a baterem nos postes quadrados da baliza de Costa Pereira. Antes isso que ganhar através de golos irregulares e/ou porque o árbitro vê mas não assinala penálti a favor do adversário..
Seguiu-se a consagração, era entregue o glorioso troféu ao capitão do Benfica, seguiram-se festejos sempre com respeito pelo adversário:
Ficam aqui os vídeos da partida que abrangem o antes, o durante e o depois:
Mais uma curiosidade, desta vez acerca da transmissão televisiva deste jogo. Naqueles tempos eram poucas as pessoas que tinham um televisor em casa, desse modo o grosso dos telespectadores estava concentrado em locais públicos como cafés, bares e restaurantes. A rtp tinha iniciado há pouco tempo as transmissões internacionais, pelo que a experiência era pouca. Se pensarmos que a tecnologia era... Enfim pré-histórica, não é difícil adivinhar que foi uma transmissão problemática.
Cheia de cortes temporários, a transmissão via tv acabou por ir abaixo sendo que as pessoas tiveram de se socorrer dos rádios e ouvir o relato de Artur Agostinho... Imaginem o aglomerado de pessoas à volta de uma caixita, a vibrar com a partida que nos últimos minutos foi de muito sofrimento para a equipa do Benfica face ao poderoso assédio do Barcelona...
Ficam as reacções da imprensa da época (façam o download das fotos para uma leitura mais correcta):
Espanha também reconheceu:
Os jogadores e treinador chegaram até a serem recebidos por Américo Tomás (Presidente da República) e Salazar para serem tornados comendadores (última fotografia da página aqui em cima à direita). Conta-se que à saída de São Bento, Guttman segredou a Fezas Vital (o presidente do Benfica): Peço demissão, como posso treinar, na próxima época, 14 commendatori?"
Foi o começo de uma era de glória. Veio mais uma conquista no ano seguinte frente ao
Real Madrid, e mais três finais com muitas histórias ainda na década de sessenta do século passado.
O meu mais sincero agradecimento a todos vós:
Alguma incorrecção, é só avisar!
PS: Sinto alguma mágoa no facto em que estes jogos imortais mais antigos não despertarem muito interesse no universo Benfiquista! As estatísticas assim o reflectem, os números de visualização são extremamente baixos para a importância dos mesmos na história deste magnífico clube. Posso afirmar de forma taxativa que o Benfica hoje seria um clube de expressão desportiva mais mediana se os homens da década de 50 e sessenta não tivessem existido e trabalhado da forma como o fizeram a troco de uma remuneração quase simbólica. Sei muito bem quem foi Eusébio mas em 1950 e 1961, o seu contributo não existiu.
Deste modo, dou comigo a questionar se de facto os adeptos do Benfica têm a noção certa sobre a forma como este gigante foi construído! Uma coisa é terem sido introduzidos ao Benfica pelos pais e amigos numa determinada altura. Outra é desconhecerem a origem do clube e olharem só para a luz que lhes é transmitida hoje em dia.
Ainda hoje há muita malta que nem sabe quem foi o primeiro Rei de Portugal e como foi que ele criou as raízes para tão poderoso país, que chegou a ditar as leis do mundo conhecido. Da mesma forma, há certamente um vastíssimo número de pessoas que não sabe que o Benfica nasceu pobre no seio do povo, que foi esse povo que lutou e o engrandeceu numa sociedade que o ostracizou e tentou (ainda tenta) enfraquecer para se tornar no maior de Portugal.
Estes jogos imortais devem ser relembrados. Na mente dos jovens do século 21 e daqueles jovens dos finais do passado século, podem estar os 7-1 que o sporting nos infligiu mas muitos há que não se lembram que nessa época conquistámos a dobradinha...
Confesso que fico maravilhado com a onda de apoio que vejo atrás do clube época atrás de época; No sucesso e no desaire, o povo está com o clube, mas a história é ofuscada pelo sensacionalismo da imprensa e é contra isso que devemos lutar... Pela história do clube e não pelo ódio a outros clubes!
E sim, isto deu trabalho... E nada recebi por isso! Já agora saibam que a direcção do Sport Lisboa e Benfica pagou os seguintes prémios a cada jogador (que jogou) por cada eliminatória vencida e pela final: 4+6+8+12+30 contos/mil escudos... Só Costa Pereira, Ângelo, Germano, Cruz, Neto, José Augusto, Santana, Águas, Coluna e Cavém é que lograram em receber 60 contos, 300 euros...
E Pluribus UNUM